Discurso de Inauguração do II Gathering da Celtic Druid Alliance
Discurso de Inauguração do II Gathering da Celtic Druid Alliance
Estimadas Irmãs e Estimados Irmãos Celtas, Convidadas e Convidados:
Guindada pelas forças ígneas do Fogo Celeste, a Grande Roleta Cósmica do Destino, tutelada pelo Espírito Universal, trouxe-nos até esta mítica Terra Céltica, onde os Deuses e Deusas da Céltia foram cultuados desde a Noite Primeva.
De modo a que o sentimento de abertura e fecundidade impere e que a Luz do Espírito possa agir dentro de cada um de nós, permitam-me que dê início a este nosso reencontro pedindo-vos que me acompanhem numa breve meditação em honra dos nossos Ancestrais. (Meditação)
“Desperte...
- Acolha livremente a Luz do Espírito Universal e assuma o compromisso de a servir;
- Defenda corajosamente a prevalência da Verdade;
- Mantenha-se insubornável perante os bens materiais e indomado pelos poderes terrenos;
E assim tornar-se-á um Peregrino do Amor…uma Voz feita de Luz e um Coração cheio de Natureza.”
Esta Tríade Céltica Lusitana servir-nos-á de mote para o itinerário que neste momento tão especial procuraremos exibir. Em boa verdade, ela traduz de modo cristalino o modo como nós, humildes caminhantes, poderemos alcançar a verdadeira Sabedoria dos Druidas Celtas, que não se refere apenas ao simples conhecimento enciclopédico sobre a nossa Tradição, mas também à capacidade de mobilizar esse stock de conhecimento para resolver problemas neste mundo da fatalidade no qual habitamos, atualmente tão necessitado da Iluminação Espiritual que a nossa Tradição Celta lhe pode realmente proporcionar. Esse despertar, refere-se, primeiramente, à intuição de que existe um Caminho que nos poderá levar, por via de um acontecer benfazejo, a poder respirar em uníssono com as mais Altas Esferas Espirituais e, por fim, a alcançar as três transcendências últimas: a Felicidade, a Liberdade e o Amor. É o Caminho da Tradição dos Druidas Celtas.
Mas esse Caminho, acerca do qual muitas narrativas emergiram, muitas delas sustentadas em meras casuísticas, inicia-se com uma livre, genuína e amorosa amarração, isto é, um juramento ou compromisso que primeiramente o assuma como pertença fundamental e que a partir dele se constitua uma Identidade ou modo Celta de ser.
Uma análise mais rigorosa ao processo de formação da Identidade Celta evidencia que a sua interpretação em cada momento histórico se encontra necessariamente condicionada por paradigmas religiosos e politicamente instituídos. Antes de mais, analisar este processo evolutivo da formação da Identidade Celta passa por compreender o que os Celtas verdadeiramente valorizavam como significativamente importante, em suma, que ideia ou noção os Celtas tinham de «Bem».
Este «Bem», que não se reduz nas categorias do ter ou não ter, da mera posse, pode projetar-se em disponibilidade em direção ao alcance de um futuro «Bem», não apenas desejado, mas fundamentalmente imaginado, sentido ou sonhado, enfim, um «Bem» verdadeiramente espiritual. No que diz respeito, quer aos Celtas, em particular, quer à Tradição e Cultura na qual nos inscrevemos, é possível identificar uma realidade e um padrão não instrumental das expectativas ou aspirações que estabelecemos na sua relação com os princípios celtas pelos quais nos regemos e os valores celtas com que nos identificamos.
A questão premente não é a possibilidade ou não da realização dos nossos desejos e intenções que fundamentam as nossas ações, mas um Mundo Celta envolto em moral senses cuja existência é de tal modo mágica que se constitui independentemente dos nossos desejos.
Quer isto dizer que nós, os Celtas contemporâneos, comportamos uma ancestral predeterminação espiritual que constitui a nossa radicalidade essencial e que presentificamos a cada momento do nosso existir. A presentificação destes referenciais espirituais, que se constituem como valores e princípios orientadores do nosso acontecer Celta, traduz-se naturalmente nas nossas atitudes, comportamentos e nas nossas ações, evidenciando decisões por nós assumidas em relação a questões não só instrumentais, mas portadoras de um significado muito mais profundo e substantivo, uma vez que deverão ocorrer necessariamente dentro de uma comunidade de pertença e que lhes dará sentido: a Grande Egrégora Celta, de que este nosso Encontro é perfeito exemplo.
A Grande Egrégora é a Comunidade a que pertencemos e o laço de pertença que a Ela nos liga é expresso na nossa maneira de ser, de estar, de agir e de sentir, mais até do que na língua e na história que partilhamos ou não dentro dessa Comunidade; é objetivado nas instituições que enquadram a nossa vida intercomunitária, como é o caso da Celtic Druid Alliance, que é a forma pela qual a nossa Identidade Coletiva Celta veicula ao mundo os seus valores fundamentais, daí a sua extrema importância para todos os grupos que a integram.
Dois fatores concorrem para o esclarecimento daquilo que está articulado e de como isso contribui para a fomentação e formação de uma identidade Pan-Céltica, quer individual, quer coletivamente entendida:
Por um lado, os fins que orientam a nossa existência não são produto duma escolha arbitrária e soberana, mas produto de uma autointerpretação contextualizada da nossa situação num horizonte comunitário espiritual e cultural que nos precede. Nesta perspetiva, aquilo que dá primevamente sentido à existência de cada um de nós, Celtas, são conteúdos substanciais pré-existentes que irão permitir tecer a própria narrativa de cada um. Estes conteúdos já se encontram pré-inscritos na Espiritualidade e na Cultura Celta sob forma de Tradição. Esta Tradição, que nos é comum, que nos liga, que nos une, que nos alia, funciona assim como referencial unificador de um sentido que, sendo comum, é necessariamente inclusivo e, como tal, pode-se Encontrar.
É da articulação entre os compromissos, as identificações, as escolhas de cada um e do horizonte comunitário-cultural que nos precede, que poderá emergir uma Identidade Celta que possa ser manifestada e reconhecida como digna pela nossa Ancestralidade e Descendência Espiritual. Deste modo, a nossa Tradição, que é atávica, só poderá ser devidamente interpretada à luz de resultados solidificados, obras resultantes de esforços comunitários e intercomunitários e de articulação de sentimentos e vivências. Caso contrário, imperará uma identidade fracionada e não reconhecível pelos tempos. No entanto, é necessário realçar que a interpretação da Tradição como um resultado solidificado não implica a sua estagnação ou a sua perpétua repetição, pelo contrário.
De facto, o desenvolvimento da Tradição Celta é garantido pela possibilidade de integração reflexiva dos antigos sentidos valorativos face a novas realidades, solidificando e afirmando os bens constitutivos através dos quais formamos a nossa identidade. São esses bens constituintes dos Celtas, enquanto indivíduos e, de outro modo, da identidade coletiva, enquanto Egrégora, que permitirão que a humanidade perceba o mapa valorativo pelo qual os Celtas de hoje se orientam na construção das suas vidas e das suas comunidades, bem como a mensagem importante que transmitem relativamente, por exemplo, à Natureza, tida pelos Celtas como Ser Supremamente Sagrado.
Tais bens constituintes podem ser designados como «fontes morais», ou seja, fontes que poderão motivar e que poderão inspirar a ação humana no mundo, sendo portanto dignos de serem perseguidos, aspirados, desejados e transmitidos. De outro modo, quando um bem constitutivo de uma comunidade não é um bem articulado a todos os seus constituintes, este poderá acabar por fenecer, isto é, perder sua força condutora e inspiradora do comportamento ou da ação humana, ou seja, corre o risco de perder eficácia como fonte moral e, por ampliação desta, como fonte espiritual.
Neste sentido, todos os Celtas dignos desse nome necessitam de um grupo de identificação. As pessoas não aprendem sozinhas o que é necessário para a sua autodefinição: as expressões, os gestos, a afetividade, o amor e a espiritualidade – enquanto formas de partilha e comunhão de Rituais e Cerimónias, mais ou menos solenes, mais simples ou mais complexas – acompanham-nos e constituem-nos desde sempre.
Se o significado de identidade Celta é aquilo que nós somos, a razão por que o somos e a maneira como o somos, a Egrégora Celta é o enquadramento no qual os nossos gostos, desejos, opiniões e aspirações ganham sentido. Quer isto dizer que, se as pessoas aqui presentes se identificam umas com as outras pela sua celticidade, isto é, pela Tradição e Espiritualidade Celta que as une, está justificada a razão pela qual a Celtic Druid Alliance optou por realizar ciclicamente estes Encontros e estas Peregrinações a outras Terras Célticas, a outras Culturas, a outras Casas, onde a partilha comum destas características poderá dar origem a uma Egrégora cada vez mais saudável e por via da qual uma identidade Pan-Céltica poderá verdadeiramente emergir em torno de um interesse, de um ideal e de uma Espiritualidade que, não obstante as suas diversas expressões, nos é comum. Serve isto para afirmar que os diversos grupos, ainda que no fundo sejam variáveis pertenças que caracterizam as pessoas e as permitem identificar, poderão sempre abrir espaço ao Encontro com os demais.
Estimadas Irmãs e Estimados Irmãos Celtas, Convidadas e Convidados:
Sejam todas e todos bem-vindos a esta vossa Casa que recebe o II Encontro da Celtic Druid Alliance. São nossos os profundos desejos que esta Peregrinação por Terras Célticas da Lusitânia seja recordada de forma tão especial ao longo das vossas vidas, quanto especial e honroso é para a Assembleia da Tradição Druídica Lusitana recebê-los no Centro Druídico da Lusitânia.
/|\ Adgnatios